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quinta-feira, 28 de março de 2013

Explosões silenciosas

Era véspera de feriado e a gente não tinha a menor preocupação de acordar cedo no dia seguinte. Nenhuma. Então naquela noite a gente conversava sobre qualquer coisa que quisesse saltar da nossa cabeça, cair na mesa e ser revirada por aquele grupo de desocupados, merecidamente desocupados, porque no nosso grupo... como se trabalha, viu?. Aos montes e muito responsavelmente. Dizem que numa situação dessas, 50% dos homens falam sobre cerveja, futebol e mulher. Outros 50% falam sobre mulher, futebol e cerveja. 

E era sobre esta última que fazíamos cair todos os nossos comentários, todas as  nossas considerações baseadas em nada e sem finalidade alguma, a não ser curtir o momento com os amigos. Porque pouca coisa a gente leva dessa vida, além das boas relações que temos com nossos familiares e nossos amigos. Altos discursos se fizeram ouvir naquela mesa de bar onde o cheiro de cerveja recendia das canecas cheias nas mesas e das garrafas cheias que o garçom desfilava como um equilibrista circense em suas bandejas. Os altos discursos que se ouviam ali contrastavam com o silêncio de FG.

O mais velho de nós - e a gente não o perdoava por isso, ao contrário, todos incentivávamos a exposição de sua senilidade, o aspecto ancião de sua figura, o tom profético de suas barbas de velho testamento - sustentava uma retórica de comparação. Segundo sua sapiência, homem que é homem tem que saber diferenciar uma Bohemia de uma Original, uma Brahma de uma Skol, uma Antártica de uma Bavária. E não abriu mão de citar as cervejas internacionais: desandou a comparar Erdinger, Stella Artois, Paulaner... e ainda teve a pachorra (ou, como diria o FG, teve a cachorra) de dizer que nenhuma cerveja se comparava à que ele havia tomado no México. Referia-se a uma que mais ou menos recentemente passou a ser comercializada no Brasil: a Sol.

De Sol aos assuntos terrenos, como mulher, e de mulher (tida como avião) de volta ao espaço e às explosões do Sol, o astro-rei, foi um pulo. Não um pulinho, mas um pulão daqueles que os astronautas dão quando não desfrutam da gravidade. Sem nenhum mililitro de coisa alguma para combustão, sem o menor mecanismo de propulsão, sem capacete e sem macacão, já meio tonto e cortando o discurso chato e involuntariamente exibicionista de nosso velhinho-mor, FG tomou a palavra.

- Cara, cês tão falando aí de espaço, de espaço, de espaço e tão fazendo muito barulho.

Segundos antes de a gente dizer que ele estava conseguindo ser mais chato que o nosso ancião, ele nos atravessou o olhar com uma segurança e uma contundência raramente vistas. Um gole longo e lento na cerveja, e ele apoiou a caneca na mesa para nos lançar as seguintes perguntas:

- Vocês sabiam que no espaço não tem barulho? Sabiam que lá em cima, tem um monte de explosão a todo momento? E mais: sabiam que tudo explode em silêncio?

Eu até me lembrava de uma frase do Pascal nesse sentido. Blaise Pascal teria dito: "o eterno silêncio do espaço me assusta". Mas achava, sinceramente, que era apenas uma frase poética, uma frase de efeito. Só que, ouvindo ali do FG, sob tantas cervejas e tanta seriedade do meu amigo, eu me calei. E fiz questão de continuar ouvindo a explicação do FG.

Mas outro colega, dada a sua juventude e natural ímpeto, não teve a mesma paciência que eu e já foi explicando que, na verdade, o espaço tem barulho, sim, só que numa frequência tão absurda que o ouvido humano não capta. Daí a impressão de silêncio.

FG não perdeu a deixa:

- Não importa: pra nós o espaço é silencioso.

Invocou-se o mais novinho da turma e, curtindo o efeito de tanta cerveja na cabeça, mandou logo um impensado "e daí, velho?"

- E daí? - respondeu FG à altura, com um tom de voz daqueles absolutamente incomodados. Como e daí, meu? Aposto que muita gente não consegue perceber que também é um universo à parte, que tem seus astros, seus asteroides, seus planetas, sua poeira cósmica. Não consegue perceber que dentro de si pode haver um monte de coisas explodindo, um monte de sentimentos que ficam calados, colados naquele vasto mundinho, dando sinais de uma existência que a maioria das pessoas sequer toma conhecimento...

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