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quarta-feira, 24 de setembro de 2014

O tempo e a ilusão da cura



Ontem escrevi aqui sobre o tempo e, ao final, concluí não ser o tempo que passa - apenas -, mas, sim, nós é que passamos por ele. Pelo fato de termos instrumentos e medidas para nos referir a ele, temos a ilusão de dominá-lo; no entanto, não passa de ilusão. Também é ilusão a nossa afirmação segundo a qual o tempo é o senhor de todas as coisas, ou ainda de que o tempo cura tudo, ou mais: de que é preciso dar tempo ao tempo. Veio bem nessa direção o relato que ouvi com um amigo num café.

Há muito tempo (e até já devo ter repetido), também publiquei aqui reflexão sobre o fato de que a ilusão é um elemento necessário à nossa sobrevivência. Afinal, "de ilusão também se vive", dizem alguns. Tanto a ilusão quanto o tempo compõem parte importante do que somos, do que acreditamos ser, do que mostramos ser... enfim, disso que chamamos de "nós" e que no interior do quarto escuro, sobre o colchão insone, chamamos "eu".

Olhar pra trás e reconstruir eventos passados alterando-os para uma forma mais amena; confundir o que de fato aconteceu com o que gostaríamos que tivesse acontecido; misturar realidade e impressão de realidade na intrincada rede de neurônios é algo que está para além do nosso controle. E nem sempre isso é possível, graças às muitas e profundas marcas que o passado deixa incrustadas em nossas lembranças - como cantava Belchior (cantarolado por aquele amigo na mesa do café): "na parede da memória esta lembrança é o quadro que dói mais".

Às vezes o passado se debruça sobre nós com uma força tão grande, que nos é impossível esquivar do golpe e maquiar sua aparência. É assim quando certas situações nos remetem aos becos doloridos das reminiscências machucadas. Se não por situações novas, por músicas, por aromas, por lugares, por fotografias que, de uma hora para outra assaltam o bloqueio consciente que fazemos e, sem pedir licença ou por gentileza, arrebata lágrimas do fundo do peito, escondidas a sete chaves, como quem dá tempo ao tempo, como quem espera que o tempo cure.

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