A peça "Orfeu da Conceição", de Vinícius de Moraes, é uma adaptação da narrativa do mito de Orfeu. Vinícius reconta a história fazendo-a acontecer nos morros cariocas de sua época. Esta foi uma das últimas apresentações que fiz em teatro. Lembro-me bem de um trecho de fala de Orfeu, em que ele diz para Eurídice um dos mais preciosos discursos para uma mulher amada. A certa altura, ele fala sobre o que ela o faz sentir: "...esta vontade de estar perto, se longe; ou de estar mais perto, se perto".
Bem sei que não expor aqui o texto todo é quase um pecado. Vale a pena ler todo, cada linha. Nesse trechinho que citei há um quê de sensibilidade que revela o sentimento que banha o coração apaixonado, que quer estar o mais perto possível da pessoa (ou mesmo da situação, da coisa, da lembrança...) que é tão amada.
Estar perto, ou no mínimo estar por perto, é sinal de uma proximidade que está para muito além da simples redução da distância física ou espacial. "Estar perto, se longe; ou mais perto, se perto" é questão de se sentir mais vivo; é se sentir em condições de oferecer/receber o que há de melhor para se oferecer: a vida que brota de cada um de nós.
Não se trata de viver o dia a dia como um escritor romântico, idealizando a vida, as situações, as pessoas; ou ainda viver em um mundo fantasioso, fruto de um escapismo resultante de insucesso. Não se trata, absolutamente, de fugir ou de evitar o que há de ruim para se viver. Trata-se, sim, de saber escolher aquilo de que ou aqueles de quem queremos estar perto. É como canta o Lenine em uma de suas mais bonitas músicas: "Quando eu olhar pro lado, eu quero estar cercado só do que me interessa".
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