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segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Tudo muda o tempo todo

"Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia" é um verso de Lulu Santos, na música Como uma Onda. Nada há de novo em suas palavras, até porque Heráclito, um filósofo pré-socrático, já havia cravado esta constatação: "Não podemos nunca entrar no mesmo rio, pois, como as águas, nós mesmos já somos outros". E será este, justamente, meu objetivo para 2013: ser diferente, ser melhor - uma pessoa melhor.

"Tudo muda o tempo todo no mundo" - continua Lulu Santos. E eu vou me valer da ambiguidade desse verso para afirmar algo. Ao mesmo tempo que ele diz que as coisas mudam constantemente, ele também diz que tudo muda o tempo todo, isto é, as coisas podem mudar o tempo. Mais: podem mudar o tempo todo. Quer dizer: posso alterar o tempo, a duração... quero, pois, que o que for bom dure mais. E que dure menos o que for ruim.

"Tudo passa, tudo sempre passará" - tudo, tudo mesmo: o que é ruim passa, mas também passa o que é bom. Por isso, neste 2013 que está despontando seus raios para me iluminar, eu quero cuidar melhor de mim e das pessoas, das minhas coisas, do meu trabalho, dos meus sonhos... e também dos meus problemas. Claro: se tudo passa, eu também passarei.

Como diz Mário Quintana: "Todos que aí estão, atravancando meu caminho, eles passarão. Eu passarinho!"   Eu vou voar sempre para onde houver vida ("há tanta vida lá fora"). Assim como no mar, onde as ondas novas vêm por cima e as velhas voltam por baixo, que as ondas novas nos tragam vida e nos banhem com o que é bom; e que as velhas levem consigo o contrário. Feliz 2013 para todos nós.

domingo, 30 de dezembro de 2012

Som de sim

"A arte de sorrir, cada vez que o mundo diz 'não'" é um verso que eu ouvia na voz de Maria Bethânia no final dos anos 70, quando vim de Minas para São Paulo, após uma sequência de 'nãos' que digladiavam com 'sins' no meio da minha infância.
 
Estou agora levantando a mão para fechar a porta de 2012. Olho com calma os trajetos que segui neste ano, as muitas conquistas, os sucessos, as alegrias, tanto sentimento de satisfação em vista de situações que receberam um sonoro 'sim'. Meu olhar também passa inevitavelmente pelo som do 'não', pelos tropeços, pelos planos que não deram certo, pelas expectativas não atendidas.
 
Entre as grandes expectativas, graças a Deus, nenhuma resultou em frustração. Entre as pequenas, no coliseu em que se engalfinham o 'não' e o 'sim', aquele tem levado vantagem sobre este em alguns poucos casos. E é por isso que neste momento, olhando pela fresta da porta entreaberta de 2012, eu desenho no meu rosto um sorriso de aprendizagem. Um sorriso tímido, mas seguro de si.
 
Reconhecendo os ardis que sustentam a força do 'não' e lamentando que o jogo limpo do 'sim' o torne vulnerável, é este sorriso que me faz olhar para trás e mirar o que é bom, o que faz o bem, o que dá à existência a sua nobreza. O ano está acabando, e eu "não tenho tempo a perder; só quero saber do que pode dar certo". Vou sorrir para o 'não' e amplificar a harmonia e a melodia do som do 'sim'.

sábado, 29 de dezembro de 2012

Só junto

O velho Raul, que volta e meia é citado aqui, canta que "Sonho que se sonha só. É só um sonho que se sonha só. Mas sonho que se sonha junto é realidade". E, como (quase) sempre, tem razão o danado. Assim como o sonho é inerente ao homem, o fato de ser gregário também o é.  "O homem é um ser gregário" - isso já dizia Aristóteles - o que eu mais admiro entre os filósofos.

Nesse sentido, ao que disse Fernando Pessoa ("Navegar é preciso. Viver não é preciso"), poderíamos - com todo respeito do mundo - acrescentar: sonhar é preciso. Duas razões me fazem acreditar nisso. Primeiro, porque, ao sonhar, entramos em contato com um universo simbólico revelador de muitas coisas que, muitas vezes, sequer admitiríamos em realidade. Segundo, porque, ao sonhar, podemos projetar nossa vida e enxergar por sobre o mundo imediato que nos cerca e nos engole. Sonhar é preciso.

Também é preciso estar junto. É preciso ser gregário. Não segregar. E, sim, agregar. A gente, junto, se acresce. Cresce. Junto, a gente divide um prato, um livro. Uma tarefa, um percurso. Um problema, uma dor. Juntos, a gente cria uma esperança maior e alimenta uma expectativa mais plausível. Juntos, a gente se faz e se refaz. Juntos, a gente cai e se levanta. Juntos, a gente vai mais longe - mesmo que o caminho é árido, estéril e inóspito (como em Vidas Secas, de Graciliano).

Daí a razão de Raul dizer que "sonho que se sonha junto é realidade", não a realidade pronta, mas a sua criação, a produção do real a cada dia, o real possível, o real buscado. O real "com-partilhado". Já o contrário disso se trata de um sonho. E só. Ou de um sonho. Sozinho. Sobre isso, as mais antigas tradições judaico-cristãs afirmam: "não é bom que o homem esteja só". É na companhia de outra pessoa que ele se constitui. É na companhia de outra pessoa que ele sonha.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Mãos de gigantes

Umberto Eco, em um de seus muito bons livros (Como se escreve uma tese) dá um conselho que comumente passa despercebido. Faço questão de destacá-lo aos meus alunos na Universidade. Segundo o autor, um dos segredos para se obter sucesso na pesquisa, é preciso apoiar-se nos ombros de gigantes. Isso porque, a partir desta posição, pode-se ver mais longe. 

Isso dá ao pesquisador a dimensão de que é preciso humildade para ser grande. Citar outros que já trilharam o percurso que se está iniciando é um sinal de grandeza. Assim é que crescemos: mirando-nos nos que são maiores que nós, seguindo seus passos, ouvindo seus conselhos, acatando suas orientações. O objetivo não ser igualmente grande, mas crescer.Vale para a pesquisa; vale para a vida.

Um pessimista me diria que a maior fonte de frustrações é o tamanho da expectativa. E complementaria com o inegável lugar-comum, segundo o qual "quanto maior a altura, maior o tombo". É verdade, não nego. Mas não se pode deixar de tentar subir, de tentar ser alguém melhor (sem que isso, é claro, implique menosprezo a quem quer que seja). É preciso querer ser grande, ser inteiro, como dizia Fernando Pessoa, e brilhar alto, como brilha a lua no alto céu e no seu reflexo no lago sereno.

A experiência que vivenciei hoje, foi de um aprendizado sem tamanho. Em uma das decisões mais difíceis que já tomei na minha vida, justamente para tentar crescer pessoal e profissionalmente, veio-me um telefonema no meio da tarde. Um telefonema de uma pessoa que, para mim, sempre foi um gigante de caráter, de profissionalismo e de competência. Recebi todo apoio necessário e, nesse sentido, vale a pena querer continuar subindo mais alto. E, caso eu caia, certamente estarei seguro pelas mãos de gigantes.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Tradição

Os versos de Renato Russo: "são crianças como você - o que vai ser quando você crescer" são tão intrigantes quanto outro: "Que país é este!". Por que intrigantes? Porque soam como perguntas. Mas não são: no primeiro uma afirmação, segundo a qual você será igual ao seu pai, quando crescer. No segundo, uma exclamação indignada. Vou me ater ao primeiro, porque tem a ver com tradição. Repassamos o que recebemos de nossos pais.

Tradição é o ato de trazer; de entregar. Assim, hábitos, crenças, valores, culturas são trazidas de geração a geração, valendo-se dos meios mais diversos: os pais que orientam os filhos, os professores que ensinam os alunos, os líderes que incutem seus seguidores, o Estado que institucionaliza práticas nos cidadãos ideologicamente. Mas, de toda forma, existe uma maneira de se manterem as coisas ao longo do tempo.

É evidente que tudo pode ser trazido, desde que conte com um mecanismo de tradição eficiente, que não rompa a cadeia, que fortaleça os elos. Dessa forma, tradicionalmente são mantidas tanto coisas ruins - como crenças discriminatórias - quanto coisas boas - como reuniões festivas (Natal, Ano Novo...). Quando alguém ou um grupo de pessoas acha conveniente, quebra-se a hegemonia de uma tradição. Neste caso, trai-se a tradição (aliás, parece que no italiano o verbo "tradire" tem o sentido de trair e de trazer...).

Mas o mais legal é que tradições podem ser criadas. Para serem mantidas e transmitidas. Criam-se, por exemplo, disputas esportivas, festivais culturais, práticas religiosas, encontros de amigos e tantas coisas boas que devem ser levadas ano a ano, de geração a geração, de pai para filho (que passará para seu filho, que passará para seu filho...). Como canta Nando Reis: "atrás do filho vêm o pai e o avô" - e que venham todos tradicionalmente fazendo o que for bom.

Para além do que se vê

Quando Tom Jobim relata que "o resto é mar, é tudo que eu não sei contar, são coisas lindas que eu tenho pra te dar", é momento de se parar para pensar para além daquilo que vemos. Especialmente quando pensamos sobre o que vemos das pessoas... e até de nós mesmos. Até onde vemos?

Em conversas com amigos hoje, amigos de longuíssima data, um deles revelava um relacionamento de um ano e meio, mais à distância do que presencial. Um relacionamento relativamente longo o suficiente para que ele se decidisse trocar a distância pela proximidade. Naturalmente, esperava encontrar as coisas que estava acostumado a ver à distância. No entanto, exceto para os que estão ficando mais velhos, ver de perto às vezes implica ver demais. Infelizmente, o que ele passou a ver do comportamento, do gênio, do modo cotidiano de ser da moça, fez com que preferisse uma distância maior do que a anterior. Incomunicável.

Por outro lado, ver de perto pode fazer com que vejamos mais do que estamos habituados a ver mesmo nas coisas e pessoas com quem temos convivência bem próxima. Neste ano, duas experiências me fizeram enxergar isso. A primeira foi quando vi meus alunos no palco do teatro da escola tocando, cantando, recitando... mostrando, para todos, que ali estavam mais do que alunos: estavam artistas - no sentido mais puro da palavra.

A outra experiência está sendo agora: assisto a um DVD que ganhei de Natal, de quem estou tendo imensa alegria de ver bem de perto. Trata-se de um disco gravado por Paul McCartney cantando apenas jazz. Imagine minha surpresa: um beatle, pilar do rock mundial, cantando jazz. Mas cantando tão bem, tão espontâneo, tão natural, que fico imaginando quanta coisa deixei de ver neste artista. E, por extensão, o quanto não deixei de ver nas pessoas o mar as coisas lindas que elas têm pra contar.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

24 de dezembro

"Eu nasci há 10 mil anos atrás e não tem nada neste mundo que eu não saiba demais", cantava Raul o refrão que quase todo mundo conhece... há menos de 10 mil anos, é claro. Mas, com todo o respeito que tenho pelo mago Raul, discordo de que caiba a alguém o fato de não haver nada no mundo que não se saiba demais.

É Natal, e nesta época do ano, tenho a felicidade de olhar para trás e ver quanta coisa boa aconteceu, quanta gente passou pela minha vida, quantas delas fortaleceram seus laços comigo - ao passo que outras infelizmente ficaram menores que a distância entre mim e elas. Lembro de cenas de casa, do trabalho; lembro de momentos ora muito agradáveis, ora tensos, mas todos são momentos em que pessoas estão envolvidas. Isso mesmo: en-volvidas. Voltadas para dentro. Para dentro da minha vida.

É a elas que eu quero agradecer. É a elas que quero dedicar minha atenção. Quero lhes dar meu abraço, meu olhar atento, meu sorriso sincero. São pessoas que quero presentear, sempre com coisas simples, que são ínfimas diante do tamanho da admiração que tenho por elas. São pessoas que me fazem saber que sei pouco sobre o mundo, que sei pouco sobre elas, que sei pouco sobre mim. Que sei pouco.

Por isso mesmo, ainda que eu vivesse há mais de 10 mil anos, eu não saberia tudo o que preciso. Daí o fascínio de se chegar à penúltima semana de um ano, poder olhar para trás e dizer o quanto ainda há para saber deste mundo, das pessoas que me dão a graça de sua companhia e de, por fim, saber de mim mesmo. Por sorte, tem sempre algo nascendo. É sempre Natal.

sábado, 22 de dezembro de 2012

Sempre assim

"Que bom que todo dia vai ser sempre assim" é o refrão de uma música do JQuest. Com esse refrão na cabeça, coloquei-me a pensar em coisas que eu queria que "fossem sempre assim" e em coisas que "são sempre assim". Poderia refletir aqui sobre coisas ruins, por exemplo, sobre aqueles padrões de comportamento repetitivo, que nos fazem reagir sempre da mesma maneira às situações iguais: é o caso das birras das crianças contrariadas; das invejas das pessoas infelizes; das mágoas das pessoas menos fortes. Mas não vou fazer isso. ("Pelo menos esta noite, não" - como canta o Lobão).

Quero falar das coisas boas. Festa de encerramento de ano que as empresas dão, a meu ver, estão entre as coisas que se encaixam no refrão acima: "que bom que todo dia vai ser sempre assim". Um momento absolutamente agradável, quando a gente se dispõe a vive-lo, a aproveitar a presença dos colegas que batalharam em conjunto para conseguir mais um ano de êxito. Come-se, bebe-se, ri-se, abraça-se, conversa-se... vive-se um momento de compartilhar alegria.

Naturalmente haverá a lembrança de pessoas que já não integram o grupo; a recordação de eventos que não deram certo; a lamentação de metas que não foram atingidas; o comentário sobre situações de certa forma constrangedoras... e outras coisas que surgiram como consequência de uma série de outras que precisam ser corrigidas. Este é justamente o lado bom das coisas ruins: aprender com elas.

Agora, é fato que em encontros como esse, sobrepujam as referências às coisas boas. Aos calorosos apertos de mão; aos olhares que se cruzam profundamente; aos abraços sinceros... juntam-se falas elogiosas, congratulações, reconhecimentos. Mais: nos planos começam a ser gestados para ganharem vida no ano novo que se escancara diante de nós, grávido de coisas boas, das quais podemos dizer: "que bom que todo dia vai ser sempre assim".

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Ir e vir

Lembro-me aqui de dois textos nos quais quero amparar a reflexão que pretendo fazer hoje. O primeiro deles é um conto, da Rachel de Queiroz, chamado Amizade. Nesse conto, a autora narra uma amizade tão intensa, que uma necessária severa separação não foi suficiente para silenciar a relação que fazia com que um pudesse chamar o outro de Amigo.
 
Outro texto é um trecho da música de Milton Nascimento, em que ele afirma que "chegar e partir são só dois lados da mesma moeda". Poderia enveredar aqui pelo ying-yang, ou mesmo pelo Humanitismo de Quincas Borba, para afirmar que as coisas que constituem este nosso mundo não são opostas entre si; mas complementares.
 
Como a moeda, que, jogada para cima a girar sobre si mesma, define a sorte do "cara ou coroa", assim também são os destinos que com as nossas escolhas damos à nossas vidas em cada pedaço dessa existência na qual nos encontramos. É assim: tomamos decisões conscientes e desejosos de que vão desembocar em um ponto agradável deste mundo. E trabalhamos nisso, para que assim o seja.
 
Às vezes essas escolhas estão sob a égide de coisas muito grandes. Outras vezes, de coisas pequenas - como escolher a camiseta para vestir. Mas algo nos torna comum: o fato de estarmos diante de escolhas que nos aproximam e/ou nos afastam. E não há como fugir a isso, pois não escolher também é uma forma de escolha - talvez não seja a melhor. A todos é dado o direito de ir e vir.

Há um segundo

Antes de cantar o refrão "Cuide bem do seu amor, seja quem for", Herbert Viana canta: "Há um segundo, tudo estava em paz". Ouvia essa música hoje, indo para a Puc e pensando no Conselho de Classe que havíamos feito ao longo de toda a manhã de hoje no Colégio onde trabalho.

Uma esmagadora maioria de alunos tiveram a felicidade de migrar para a série seguinte. Por sua própria competência e por terem sabido lidar com as regras da escola, ganharam o direito de cursar a última fase de sua educação básica: o Ensino Médio. Outros, no entanto, não obtiveram o mesmo resultado.
 
Daí cabe a reflexão: esses meninos e meninas não foram reprovados ali, naquele Conselho. Mas antes. A questão é o quanto antes? Em que momento eles se depararam com uma dificuldade e não conseguiram transpor nem souberam desenvolver estratégias para superar. Em que momento decidiram estudar menos ou usar subterfúgios? Em que momento decidiram contar com a boa-vontade de um Conselho?
 
Em que segundo "tudo estava em paz"? Quando e por quê deixou de estar? Por que motivos não se ouviu o rumor da quebra da paz? Até que segundo a confiança foi maior do que a prudência? Mais: quantas vezes esse segundo vai voltar? Em que situações? Sim, porque ele é igualzinho a todos os segundos. O barulho do pêndulo ou a mudança do caracter digital é sempre igual e na mesma regularidade. O diferencial é o que fazemos no segundo em que tudo está em paz.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Se perto, mais perto

A peça "Orfeu da Conceição", de Vinícius de Moraes, é uma adaptação da narrativa do mito de Orfeu. Vinícius reconta a história fazendo-a acontecer nos morros cariocas de sua época. Esta foi uma das últimas apresentações que fiz em teatro. Lembro-me bem de um trecho de fala de Orfeu, em que ele diz para Eurídice um dos mais preciosos discursos para uma mulher amada. A certa altura, ele fala sobre o que ela o faz sentir: "...esta vontade de estar perto, se longe; ou de estar mais perto, se perto".
 
Bem sei que não expor aqui o texto todo é quase um pecado. Vale a pena ler todo, cada linha. Nesse trechinho que citei há um quê de sensibilidade que revela o sentimento que banha o coração apaixonado, que quer estar o mais perto possível da pessoa (ou mesmo da situação, da coisa, da lembrança...) que é tão amada.
 
Estar perto, ou no mínimo estar por perto, é sinal de uma proximidade que está para muito além da simples redução da distância física ou espacial. "Estar perto, se longe; ou mais perto, se perto" é questão de se sentir mais vivo; é se sentir em condições de oferecer/receber o que há de melhor para se oferecer: a vida que brota de cada um de nós.
 
Não se trata de viver o dia a dia como um escritor romântico, idealizando a vida, as situações, as pessoas; ou ainda viver em um mundo fantasioso, fruto de um escapismo resultante de insucesso. Não se trata, absolutamente, de fugir ou de evitar o que há de ruim para se viver. Trata-se, sim, de saber escolher aquilo de que ou aqueles de quem queremos estar perto. É como canta o Lenine em uma de suas mais bonitas músicas: "Quando eu olhar pro lado, eu quero estar cercado só do que me interessa". 

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Faz tão bem

Lulu Santos, que ficou mais famoso agora depois de sua participação no The Voice Brasil, como já disse aqui várias vezes, tem um timbre de voz interessante, um melodia bem trabalhada e uma harmonia agradável, além, é claro, de letras instigantes para suas canções. Já citem algumas aqui, e certamente acontecerá de eu citar outras ou a mesma em outra ocasião. Gosto dos versos "Ela me faz tão bem, que eu também quero fazer isso por ela".
 
Independentemente de quem ou do que for o "ela" que cada um quiser colocar no lugar do "ela" daquele verso, é importante saber que alguém ou algo que nos faz bem em sua interação conosco merece ser mantido, porque o bem é uma estrada de mão dupla, é um espelho que recebe e reflete imagem, é um corpo que enfeita a si mesmo. Para certas pessoas (excluo aqui as interesseiras), fazer o bem muitas vezes não tem os outros como beneficiários; mas a si mesmas.
 
O verso diz que fazer o bem a ela é a consequência de ela fazer o bem. Assim, parece-me importante ter em mente o tempo todo, como um alarme, como um lembrete de geladeira, como um laço no dedo e, sobretudo, como uma consciência perene o fato de essa reciprocidade precisa ser mantida, cultivada, reavivada; precisa ser ampliada, fortalecida, acrescida para que esse bem se torne bem maior. Para que se torne um bem maior.
 
O veneno contra isso será a acomodação ao status quo, à condição de mero espectador daquele bem recebido. Como na parábola, segundo a qual enquanto um dos filhos multiplicou o bem recebido a cento por um, o outro pegou o bem e o enterrou no quintal. O Bem não está diante de nós para ser enterrado e desalmado, mas para fincar-se em nós em gerar frondosas, copadas e frutíferas árvores.
 

domingo, 16 de dezembro de 2012

Bom

Na música Bom Pra Você, Zélia Duncan sugere: "Faça o que é bom, sinta o que é bom, pense o que é bom. Bom pra você". Adoraria transcrever a letra toda, mas fica aqui a sugestão de que se leia e se ouça a música toda. Nisso o Youtube pode nos ajudar e muito. Acessar coisas boas no Youtube também é bom.

Difícil é definir "o que é bom". Mais ainda é definir "o que é bom pra você", na medida em que tanto o "bom" quanto o "pra você" são expressões absolutamente variáveis não só de pessoa para pessoa (o que é óbvio e me irrita dizer), mas é variável na própria pessoa. Em contextos diferentes, o "bom" pode ser uma coisa ou outra para a mesma pessoa. E vice versa. Como diz o Oswaldo Montenegro na música A Lista: "Quantas canções que você não cantava, hoje assobia pra sobreviver?"

Pois é. Cá com meus botões, com toda a chance do mundo de estar errado, penso que o bom é como o justo. Isto é: bom é aquilo que deve ser. Talvez esteja aí o parâmetro (não menos variável, é claro) para saber se estamos fazendo, sentindo e pensando o que é bom. O que fazemos, sentimos, pensamos etc. é aquilo que deve ser feito, sentido, pensado etc.?

Para que o bom torne-se melhor, não basta que seja bom apenas para mim. Tem que ser também para o outro. Porque eu só sou eu à medida que existe um outro. Para não mergulharmos nas águas turbulentas e traiçoeiras do egoísmo, o que for bom há de ser para mim e para o outro.

Nós: criadores

"Is this the world we created?", cantava Fred Mercury em uma de suas canções de apelo social. Realmente, o artista que imortalizou refrões como "We are the champions" e "We will rock you", além de tantos outros em tantas melodias milimetricamente construídas por ele mesmo para cada instrumento e voz, tinha o que dizer sobre o mundo que (e em que) ele vivia.

Há muita coisa nesse nosso mundo que talvez não devesse estar aí. A própria música que citei acima fala de crianças famintas e desprotegidas, por exemplo. Corrupção em todas as esferas cotidianas; violência de toda natureza: física, econômica, psicológica...; doenças, injustiça, indiferença. Não há dúvida de que somos inteiramente responsáveis por tudo isso. Se isso não é o, isso está no mundo que criamos. Ora, agora me ocorre Chico Buarque: "você que inventou a tristeza, tenha a fineza de desinventar".

Infelizmente - e acho que isso é do ser humano e não de individualidades - temos uma imensa capacidade de valorizar as coisas negativas em detrimento das positivas, as quais jogamos no buraco do esquecimento e cobrimos com a terra da rotina; coisas que deitamos na cama do silêncio e cobrimos com o cobertor da correria. Temos tanto sorriso para dar, tanto abraço para receber, tanto incentivo para oferecer; tem tanto brilho no dia, tanta beleza na noite; sobra verde nas vegetações e aroma nas flores. Há tantas vitórias a contar e outras tantas sendo construídas... Para essas coisas boas é que meus olhos querem se abrir.

O mundo que criamos a cada momento tem de tudo, e a cada dia terá mais coisas. Boas e ruins. Misturadas, potencializadas. Estão aí para serem valorizadas por nós. Questão de escolha: as coisas ruins; as boas. Tomara que a gente consiga criar algo para desinventar a tristeza que nós mesmos pusemos no mundo que vivemos.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Saber perder

Em 1962, tempo em que ainda tinha muito prestígio o uso do pronome TU, um cantor negro excelente, chamado Noite Ilustrada cantava: "Reconhece a queda. Não desanima. Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima". Lição maior de perseverança talvez seja pouco possível encontrar. Lição maior de como lidar com a perda, também.

Duas experiências hoje me fizeram reafirmar aquilo em que sempre acreditei e aquilo que muitas vezes na vida precisei colocar em prática: é preciso saber perder. A partir do momento em que entramos numa batalha, a derrota se torna uma das possibilidades. O problema nem é a derrota em si, mas o modo como lidamos com ela, isto é, como a absorvemos em nossa vida. Ou, ainda, se sabemos utilizar a derrota contra nós ou a nosso favor.

No início da noite, quando fazia a arguição de uma aluna que defendia seu trabalho de conclusão de curso, no exercício do meu papel de avaliador, precisei dizer a ela o que aquele TCC tinha de bom e, até pela grande quantidade, precisei também dizer os pontos em que o trabalho precisava melhorar. Reconhecendo que sua pesquisa realmente carecia de melhoria, com olhos marejados, aquela aluna aprendeu e apreendeu o que lhe fora dito. Mais: comprometeu-se consigo mesma a superar, por si própria, aquelas dificuldades.

Quando a noite terminava, assisti a um jogo de futebol - gosto muito de assistir a partidas decisivas, pois cada minuto é disputado como se fosse o último. Mas, para surpresa geral, um dos times - que terminou a primeira etapa do jogo perdendo por dois gols de diferença - não voltou ao campo de jogo. Abandonou a batalha. Dessa forma, não só deu ao adversário presente o título de campeão, como também perdeu a oportunidade de aprender a perder, pois não se levantou, não deu a volta por cima e, por consequência, vai ficar com a poeira desta derrota sobre si para sempre. Assim como o pronome TU, perderá o prestígio.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Olhar, ver e entender

A primeira vista. Esse é o título de uma das músicas mais bonitas de Chico César, outro cantor e compositor cujas músicas e letras muito me agradam. Nesta, um dos versos é: "Quando o olho brilhou, entendi". Quero me valer desse verso para a reflexão de hoje, que é, de certa forma, uma continuação do que publiquei ontem.
 
Penso que o lugar-comum segundo o qual "de ilusão também se vive" tem seu lugar no dia a dia de muita gente. Já postei aqui uma experiência minha em que, ao ensinar literatura aos meus alunos de 9º ano, desenvolvi com eles a ideia de que as ilusões muitas vezes são necessárias para atenuar o peso de certos momentos da vida. Acredito que muitos têm a ilusão de que são uma coisa, um ser, um elemento isolado no mundo; único; separado de tudo e de todos.
 
Até certa idade da vida, os bebês acreditam firmemente que tudo o que há e todos à sua volta são uma extensão de si mesmos. Por isso, choram aos berros quando lhes tiram um carrinho, uma boneca... ou mesmo quando nos afastamos deles. Parece estar sendo tirado algo deles; algo que não sabem se voltarão a ter. Ou, ainda, parece estarem sendo tirados das coisas. Quando as coisas ou as pessoas voltam, seus olhos brilham. Quando as coisas ou pessoas voltam, eles entendem. Porque voltam a se ver completos.
 
Quando amamos algo ou alguém, nossos olhos brilham de modo a intensificar nosso objeto de amor. Nossas pálpebras se abrem e se fecham num movimento que traz esse objeto para dentro e o conduz para fora sem que pareça que ele está dentro ou fora. Está em nós. Determina e é determinado pelo nosso olhar. É por olharmos assim o objeto do nosso amor, que conseguimos finalmente entender. Porque nos vemos completos. E nisso (também) Chico César tem razão: "quando o olho brilhou, entendi".

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Olhos: espelhos retroflexos

Gosto do Beto Guedes, um daqueles muitos mineiros do famoso Clube da Esquina. Assim como Chico Buarque, Nando Reis, Guilherme Arantes (entre os homens) e Fernanda Takai (entre as mulheres), Beto Guedes é daqueles que têm pouco tônus vocal, mas um imenso poder de cantar frases que encantam, ensinam e calam na gente. Um dos versos dele diz: "Seus olhos são espelhos d'água".

Associo aqui esse verso a duas experiências inesquecíveis para mim e que fizeram a minha vida ser melhor. Ambas, ligadas aos olhos. Uma delas, debaixo de uma lua que insistia em não deixar sua luz emudecer diante da noite escura, se deu ao som da música do Chico Buarque, especialmente os versos "Morena dos olhos d'água, tire os seus olhos do mar. Vem ver que a vida ainda vale o sorriso que tenho pra lhe dar".

A outra se deu também nos limites escuros da madrugada que insistia em se fazer passar silenciosa, inexorável em sua marcha na direção dos raios do sol que tardava vir. Minha memória se esforçava para alcançar o texto de Ítalo Calvino, que - no livro Cidades Invisíveis - narra viagens de Marco Polo para descrever ao Rei Kublai Khan as cidades de seu reino - que este desconhecia.

Para Calvino - na voz de Marco Polo -, são nossas pálpebras que nos separam do mundo que vemos, das pessoas com quem convivemos. A certa altura da vida, já não sabemos mais distinguir com nitidez o que fica para dentro das pálpebras daquilo que fica para a fora delas. O ser das coisas e as pessoas externas a nós se misturam com o ser que somos nós, a ponto de não sabermos se vemos o que realmente vemos ou se vemos o que queremos ver - a nossa projeção sobre o que e sobre quem vemos. Nossos olhos: espelhos retroflexos.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Óbvio ululante

Lá pela década de 50 do século passado, Nélson Rodrigues cunhou a expressão "Óbvio ululante". Como tantas outras do autor, essa expressão ficou integrando o imaginário coletivo brasileiro, muitas vezes com o sentido alterado, dado o desconhecimento do adjetivo "ululante". Já ouvi, muitas vezes, pessoas dizerem óbvio nulante, óbvio lulante... e por aí afora.

Ululante é a característica daquilo que ulula, isto é daquilo que grita. Nesse sentido, a expressão significa que algo é tão claro, tão explícito, tão nítido, que é impossível não perceber. Não se trata de um óbvio simples, mas de um óbvio óbvio, se me permitem o recurso da repetição como intensificador. Considerando que óbvio é a característica daquilo que (de tão claro, lógico e aceito) não requer esclarecimento e que é axiomático e incontestável, podemos deduzir que é óbvio ululante.

Naturalmente há coisas que são absolutamente óbvias para algumas pessoas, e não o são para outras. Desde coisas simples como reconhecer uma hipotenusa ou um zeugma até coisas mais complexas, como saber o que pode e o que deve ser dito em determinadas situações. Quebrar o óbvio pode não ser uma boa ideia, especialmente se se tratar de um óbvio ululante. A não ser que seja óbvio que determinado óbvio deva ser quebrado. Ainda que seja ululante.

Claro que tudo que existe, existe dentro de uma rede de composição e de significação que faz as coisas, ideias e relações serem como são. Por legitimação, tornaram-se óbvias e, por isso mesmo, acreditamos nelas assim como são, assim como se afiguram diante de nós. Salvo uma grande e premente necessidade de 're-volução' ou de leves e perenes mudanças, vale respeitar o óbvio, pois ele é aquilo que mantém coesas as coisas, ideias e relações. O óbvio ululante... muito mais.

Eu sou: identidades

Voltando para casa hoje, ouvindo música e cantando, como sempre, me deparei com uma cena inesperada. Diante de mim, na escada rolante que subia tanta gente, uma mocinha deixou cair sua identidade e não percebeu. Gentilmente, me abaixei, peguei o documento e o restituí a ela, que agradeceu e seguiu "para o alto e avante". Aquilo me fez pensar sobre identidade. Ou melhor: sobre identidades.

"Eu sou a luz das estrelas. Eu sou a cor do luar. Eu sou as coisas da vida. Eu sou o medo de amar. Eu sou o medo do fraco; a força da imaginação; o blefe do jogador. Eu sou! Eu fui! Eu vou! Eu sou o seu sacrifício. A placa de contramão. O sangue no olhar do vampiro e as juras de maldição. Eu sou a vela que acende. Eu sou a luz que se apaga. Eu sou a beira do abismo. Eu sou o tudo e o nada". Além dessas, muitas outras definições Raul vai dando de si ao longo da música Gita.

É claro que ele não está falando de si mesmo (Raul Santos Seixas, nascido em 28/06/45). Um eu-lírico é que fala no poema. De identidade tão múltipla e variada. Tão mutante e desigual. Tão dinâmica e tão fixa (enquanto é). Uma identidade que se refaz, que se reconstrói. Que se entende como parte de tudo, como parte de um todo no qual ela mesma está inserida. Não, não se trata de uma identidade lábil, volátil, frágil e imprecisa. Não se trata de uma identidade esquizofrênica, mas rica em possibilidades.

Foi-se o tempo em que se achava que nossa identidade era como um bloco único, um monolito que já nasce de um jeito e morre desse mesmo jeito. Foi-se o tempo em que o diferente era apenas o outro. Já vai longe a época em que se acreditava que haveria necessariamente um eu e um outro, como duas realidades totalmente dissociadas. Não: hoje se sabe que o um só se constitui na dinâmica da existência do outro. Os vários uns e os diversos outros são parte de um todo maior, que é esta humanidade - ao mesmo tempo única, ao mesmo tempo múltipla. Assim como as identidades: feitas, refeitas perdidas, achadas, acrescidas, alteradas... 

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Revelações

"Tudo aqui quer me revelar, unha roídas, ausências, visitas, flores na sala de estar...", canta Zélia Duncan em mais uma de suas belíssimas letras que são revstidas de uma voz bonita, forte e muito afinada. E, de fato, nesta música, eu sempre paro e penso nas coisas que me revelam e nas coisas que nos outros os revelam.

Ontem pude conduzir um sarau de fechamento de 9ºano, que envolveu um número muito grande de alunos, direta e indiretamente envolvidos. Além dos alunos, estavam envolvidos também professores, funcionários do Colégio... sem contar naturalmente as famílias que sempre participam da elaboração do que os filhos fazem.

No palco, em meio às apresentações de músicas, de poemas, de danças e de tanta coisa bonita, muito daquilo trazia para mim, a cada minuto, um flash a mais dos alunos, uma visão que ainda não havia reparado, um ângulo, uma faceta, uma parte da alma deles que eu ainda não conhecia. Dois pensamentos me assaltaram a concentração e a emoção.

O primeiro veio por meio de um chavão, por meio de um lugar-comum que, de tão utilizado perdeu sua força argumentativa e, até mesmo, semântica: o que os olhos não veem, o coração não sente. Realmente, eu não via muito daquilo que, emanando dos alunos, se afigurava diante de todos nós. O outro pensamento foi o de que esta visão aberta para o prisma que compõe cada aluno impede que os vejamos apenas como alunos. Naturalmente isso se espalha para toda e qualquer pessoa, pois tudo em cada um de nós quer nos revelar.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O melhor

Quem ouve a música "Infinito Particular", de Marisa Monte, se depara necessariamente com os versos iniciais: "eis o melhor e o pior de mim". Pus-me a pensar nisso hoje, que foi um dia atribuladíssimo, com aulas, ensaios, pagamentos de conta, encontros de trabalho, passeio com filhas e tanto mais. É madrugada (embora o horário do blog tenha sempre um estranho "fuso" de 6 horas a menos). E eis-me aqui para fechar o dia escrevendo.

Primeiro, é preciso destacar que as pessoas ideais, das quais somente viriam coisas boas, em gestos, palavras, atitudes etc., ah... essas aí, sei não, viu? Acho que só existiram na formulação de Platão, naquele que ele chamou de "mundo das ideias". As mulheres que buscam o homem ideal, os pais que procuram os filhos ideais, os professores que sem embrenham atrás de alunos ideais, empresários atrás de profissionais ideais, eleitores que querem eleger polísticos ideais... Tem não.

Também não dá para dizer que ninguém é bom. Esta não é uma ideia completa (se é que o há). Ninguém tem coração no qual só habite o mal, ninguém maquina maldade o tempo todo. A composição do nosso ser é um tanto mais complexa do que imaginou Maniqueu (que, aliás, ao conceber tudo como uma realidade dual na qual só existem o bem e mal, acabou propiciando a criação do termo "maniqueísmo"). Talvez seja mais complexa do que propôs Freud, mais simbólica do que defendeu Jung...

O fato é que o bem e o mal estão em nós e ajudam a constituir a nossa natureza. Em nós, sem a menor sombra de dúvida, estão o melhor e o pior. Daí, uma questão de escolha: o que temos a oferecer para nós mesmos, para o nosso próximo, para o nosso mundo. Que líquido tem na nossa garrafa? Que palavras há no livro que somos nós? O que escolhemos dar a beber? O que escolhemos oferecemos de nós para que leiam? 

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

O olho do tigre

Uma das músicas mais encorajadoras, tanto por sua letra quanto por sua melodia, seu ritmo, seus arranjos é "Eye of the tiger", do Survivor. É a mesma que foi tema do filme Rocky Balboa, estrelado por Sylvester Stallone, em sua época áurea. As batidas da música pareciam entrar como som de cada pancada que Rocky dava em seu adversário, que lhe parecia indestrutível, e, por isso mesmo, extremamente desafiador. Aliás, este foi o nome que o filme recebeu no Brasil: Rocky III - o desafio supremo.

A música é tão boa, que fez o filme concorrer ao Oscar na categoria de melhor canção. É muito interessante a parte da letra que diz: "É o olho do tigre, é a emoção da luta crescendo ao nível do desafio do nosso rival". A música é de 1982; já faz um bom tempo, mas ela continua a motivar muita gente hoje - especialmente daqueles que aprenderam a usar a seu favor o tamanho do desafio que se apresenta a eles. Sim, aquele tipo de gente que, diante de uma dificuldade extrema, enxerga-a como uma oportunidade.

Tive hoje a feliz oportunidade de assistir ao jogo semi-final de basquete de um time que um ex-aluno meu integra. Jogo duro, pau-a-pau, como dizemos na gíria esportiva. Adversário árido, que disputava milímetro a milímetro da quadra o direito de ir à final. Como armador do time, as principais jogadas passavam por suas mãos, fosse para atacar, fosse para defender. Fez cestas importantíssimas ao longo do jogo - cestas de quem chama para si a responsabilidade pela vitória diante do adversário.

Mas nenhuma foi tão bonita e importante quanto aquela. Jogo empatado até os últimos 5 segundos. Bola sai em lateral para a equipe do meu aluno. Diante de todos os seus adversários que o olhavam com "eye of the tiger" esperando um erro para dar o golpe final, ele recebeu a bola e numa velocidade e plasticidade incríveis, passou por três adversários e, não só fez a cesta, como também sofreu a falta que ele mesmo converteu e mais um ponto. Brilhante: diante do "desafio supremo", a despeito do cansaço, de sua baixa estatura e de seu corpo ainda franzino, partiu para cima do olho do tigre e voltou de lá com a vitória e o reconhecimento de todos. É... o esporte é mesmo uma metáfora da vida.